Postagens

INVISÍVEIS (Ricardo Moreira)

Nada mais assusta quem viveu o baixo Augusta, quem perambulou pelo Glicério (e isso é sério); defendeu uma grana no auge da Nestor Pestana; frequentou a noite, desvendando seus mistérios. Nada intriga quem ocupa as ruas do Bixiga; passa o tempo ao léu na praça Princesa Isabel; madrugada afora,  toma uns drinques na Aurora... Comemora estar seguro na Amaral Gurgel. Há quem, entre os despejados da Barão de Duprat, jure que o filho do Criador já foi flagrado disfarçado por lá.

BENFAZEJO (Ricardo Moreira)

Houve quem achasse um tanto estranho  o  agir daquele cidadão a poucos metros da esquina... Ovelha que destoa do rebanho ou flor que nasce junto a escombros de uma ética em ruínas.   Abria mão de quase todo ganho e, benfazejo, construía em caridade sua rotina, sem olhar pra origem ou tamanho e sem julgar,  como é de praxe no horror que se dissemina.   O amanhã não importa, tampouco o antanho... Espalha a paz, conserta o hoje, as ruas são sua oficina. Dá pão ao faminto; dá ao sujo o banho e, aos enfermos, ele proporciona a vacina.

PAFÚNCIO (Ricardo Moreira)

É comum confirmar-se em jornais o que a arte já anunciou bem lá atrás.  Se, por vezes, isso é involuntário, uns casos são só "tradução de sinais". Antes de virarem reais, já se ouviu em canção, em um filme ou cartaz... as ruínas de estelionatários,  tragédias ou viagens espaciais. Daí a intenção do "ninguém fala mais!", "calem o artista!", "interrompam o prenúncio!" É que o artista antecipa os anais ainda mais se o poder tá nas mãos de um pafúncio.

NEM QUE EU ME DESDOBRE EM TRÊS (Ricardo Moreira)

Eu vivo vendo molecada atrás de bola, mendigo pedindo esmola e loja querendo freguês, mas passarinho implorando por gaiola,  com historinha que não cola,  juro que é a primeira vez. Já vi fracote sem força pra erguer sacola, bunda que no chão se esfola e ao meu salário sobrar mês... ... Quem não tem nem para o feijão querer pistola?! É uma coisa que não rola, sou sincero com vocês. Há quem prefira colchão de espuma ao de mola, guaraná a Coca-Cola,  qualquer língua ao Português... ... Gente feliz ao cortarem verba pra escola e se excitando ao ver gandolas?! Nem que eu me desdobre em três.

O JOIO E O TRIGO (Ricardo Moreira)

Jurandir tinha uma vida honesta, filho de uma doméstica, ajudava em construção. E, assim, diversão, lazer e festa quase sempre eram deixados pra depois da obrigação. Não nasceu com estrela na testa, sua casa, bem modesta, é o que restou como opção. Certo dia viu por uma fresta, da janela do seu quarto, intensa movimentação. Como caçadores na floresta, homens de uma força tática entravam em “operação”. Já vira outras vezes só que nesta o ruído dos blindados fazia tremer seu chão. Nessas horas somente o que resta é esconder-se ou, sei lá, tentar fazer uma oração. Não há tempo pra provar que “presta” e nem para aparar arestas da própria argumentação. Ademais, se alguém do morro morre, quem se importa? Quem protesta? Passa logo a comoção Se ficar, a bala come; o tiro pega se ele corre, a pele preta atrai a munição. Em ações de extremo perigo, distinguir joio do trigo às vezes causa confusão. Se der erro, há sempre um texto antigo: “Vive em bairro ´inimigo´. se morreu, era ladrão.”

DONS DE NOSTRADAMUS (Ricardo Moreira)

Dilermando e Guilhermina já não fazem planos e ela gasta suas horas reformando uns panos  Perguntados, nem os próprios sabem desde quando Ele chega da oficina bravo e reclamando Dilermando acha difícil conviver com humanos, pelo ofício oculta os pensamentos mais insanos... Besta-fera adaptando-se aos centros urbanos, desagrada, tanto faz, aos gregos e aos troianos. Guilhermina às vezes fala com a menina que ela deixou de ser há muitos anos. Pensa que, lá atrás, se entrasse em certa esquina ou quem sabe até sumisse com uns ciganos, não cumprisse desinteressante sina e sempre lamenta não ter dons de Nostradamus. Guilhermina e Dilermando e a maçante rotina... Dilermando e Guilhermina só se suportando.

PONTO FORA DA CURVA (Ricardo Moreira)

Sempre haverá aquele  que destoa do conjunto e nem chamo a atenção pra pedir vela a maus defuntos. Ser quem desafina o coro é possível, e esse é o assunto. E se não é mesmo o escudo aos desaforos? Eu pergunto... Tem milho que resiste ao fogo e ao óleo  e não estoura; tem semente que não brota nem com adubo na lavoura... Tem papel que não sucumbe ao corte da melhor tesoura. Quem somos nós pra julgar se um é "gravata", e o outro é "vassoura"... ... Se o melhor homem do mundo  nasceu numa manjedoura?

REALIDADE PARALELA - O INCEL (Ricardo Moreira)

Pra “viralizar” fez o que pôde, tinha até um QR Code estampado em sua camisa que direcionava a um link de uma foto junto a uns drinks numa praia de Ibiza. Diz que tem canções para download , uma banda com três roadies ... Isso não passa de “brisa”. Produz do seu quarto lá em Mairinque um Chroma key num fundo pink , (um E.V.A. que ele improvisa). Na vida real, é muito tímido o menino, o que preocupa sua mãe, dona Adalgisa. Muito mais profundo ao fato de que ele não brinque é que, em verdade, ele nem se socializa. Diz que tem canções para download , uma banda com três roadies ... Isso não passa de “brisa”. Produz do seu quarto lá em Mairinque um Chroma key num fundo pink , e a imagem, assim, sai imprecisa.

CAMARILHA (Ricardo Moreira)

Desonestos fazem isso e aquilo, põem cem anos de sigilo e ainda há quem os defenda. Marcam encontros fora da agenda, incrementam a própria renda e ai de quem ousar puni-los. Calculam propina em ouro... Em quilos, Dão filé a seus pupilos; acomodações, vivendas. Vai custar para que o povo aprenda, a história de ser "mito" é lenda. (E é tanto o ódio que eu destilo). Gastos com cartão corporativo, compras com dinheiro vivo; penso em "Queda da Bastilha". Jamais vivi um período tão nocivo, faltam mesmo adjetivos pra se usar com tal quadrilha.

HEMATOMA E CICATRIZ (Ricardo Moreira)

Num reino distante, cheio de uber e ambulante, Viviam o Hematoma e sua esposa Cicatriz. Por acharem a alegria algo irritante, A dupla preferiu ser infeliz. Vendo a paisagem, lá de cima de um mirante, Ela se vira para o seu marido e diz: - Como é reconfortante bombas em manifestantes. Praticamente, um show (dos que se pedem bis). De pronto, ele dá corda, ratifica... Ele concorda: - É isso mesmo! O mal se corta é na raiz. Tem que proporcionar o que merece essa horda, usando as formas mais cruéis e mais hostis. - Povo que tem coisa de mais para comer engorda. Vamos botar, de uma vez, pingos nos is. Já já um desses diz que a nossa Terra não tem borda e que, pagando bem, tem lado um juiz.

NOTA DE REPÚDIO (Ricardo Moreira)

Não me venha com essa de repúdio em nota,  Além de covardia, é atitude idiota. A lei define como agir. A lei define como agir. Quando eles pisam nuns pescoços com suas botas. Sentam em cima do decoro e fazem chacota. A lei define como agir. A lei define como agir. Quando os privilégios se restringem a uma patota, e o entreguista anda com máscara de patriota. Quem tem medo da reação aceitou a derrota, E é na ausência da coragem que o fascismo brota. A lei define como agir. A lei define como agir... (Com Jair)

EFEITO BORBOLETA (A TEORIA DO CAOS)

Uma borboleta bateu asas no Japão, o que me fez, cá no Brasil, fuçar gavetas. Não sairia em meio àquele furacão... Sons de trovão, telhas voando e nuvens pretas. Meu celular ficou sem comunicação, fiquei restrito a anotações em cadernetas. Achei moedas fora de circulação, desde cruzados, rúpias, francos e pesetas. Fotos antigas ativaram a emoção... Foram para o lixo coisas muito obsoletas: Versos simplórios sem nenhuma pretensão e uma arminha que atirava espoletas. Achei o número de uma antiga paixão, cessou o vento e entrou em ação um eu "xereta". Achei a moça, e ela tem uma criação do tal inseto do outro lado do planeta.

PERSONAGEM DE FLAUBERT (Ricardo Moreira)

Ele me jurava amor eterno e, assim, nas noites de inverno, me levava ao seu chalé... Me escrevia versos no caderno, se "aprumava" com bons termos, me acordava com café. Me aquecia em frente a uma lareira, me explicava em qual madeira se envelhece um Carménère, eu sorria com qualquer besteira, até porque por vez primeira alguém me amou como mulher. Preservava o clima de paquera e, assim, durante a primavera, era o meu "chef" e o meu chofer... E junto a gente viu de "A bela e a fera" até "Platoon", quase que zera os musicais de Fred Astaire. Nesse tempo achei que era besteira, mas me deu uma ciumeira da invenção dos Lumière... É que ele acompanhava a história inteira e me esquecia na cadeira  às vezes sem um olhar sequer. Fui me acostumando com o abandono e repetia todo o outono "Seja o que Deus quiser" Nem vinha me ver de "tanto sono" e me trocou pelo kimono ou outra distração qualquer. Tinha o futebol da sexta-feira, disse não

PAUTAS MORAIS (Ricardo Moreira)

Havia ali duas meninas tomando cerveja, na praça do coreto, na frente da igreja. Eis que chega um rapaz e uma delas corteja, mas fica revoltado ao ver que elas se beijam. Saiu reclamando, batendo no peito, dizendo que isso era o fim, Mais um entre tantos exemplos de "macho" que desde pequeno ouve "sim". Desatento, perdeu o celular, foi um tal de "Ora veja!", Ao se escancararem detalhes como em uma bandeja... Citar teoria freudiana é o que o fato enseja: Quando se abomina uma coisa, é sinal que a deseja. Claro que o moço é bem Vivo e mantém seus sigilos num chip da TIM Sai de cena o feroz e agressivo... No escuro, prefere chamar-se Yasmin. Quem no palco se mostra ativo com pautas morais geralmente é assim: Abusa no salto, no talco, é festivo na intimidade do seu camarim.

INTRADUZÍVEL (Ricardo Moreira)

O bigorrilha, então, desceu da traquitana, ostentando bugigangas, trecos e quinquilharias; fazendo pose como se fosse um bacana, um verso de Mário Quintana, um detentor de honrarias. Chamando atenção pra si, o doidivanas cria possuir um brilho de ofuscar as Três Marias. Vi que atendia pela graça de Pestana,  e é assim que ele subiu aos trending topics uns dias. Caricatura em filme do Hugo Carvana,  passou a ser aclamado como um verdadeiro guia, ganhou as capas das revistas da semana, afiliou-se a uma legenda, pela qual concorreria... ... Ao posto-mor de uma nação republicana,  certo de que o eleitorado nele se espelharia. E, eis que o povo (e sua vontade soberana) hoje aguenta as trapalhadas do infeliz dia após dia.

IMPACTO SOCIAL (Rdo Moreira)

Doutor Irineu planta soja e alguns deputados pra agir no Congresso; Matheus com sua moto se arroja, fazendo delivery em Bonsucesso. Pastor Valdecir se enoja se as aulas na escola falarem de sexo; Matilde, em sua loja vazia, lê que o país vivencia o progresso. Participam de um grupo em comum, porém só dois deles chafurdam em dinheiro. Estes vivem em Miami ou Cancún, os outros apelando à luz do candeeiro. Compartilham, na rede, ideais... Reconhecem-se iguais como "bons brasileiros", ao trombarem-se em espaços reais, é um tal de SUV derrubar motoqueiro.

YIN E YANG (Ricardo Moreira - texto musicado por Márcio Policastro)

Ela é chás, incensos, flautas e florais. Ele é energético e canções que estão na moda. Ela é pés descalços, chakras, prana e paz... Ele é bar, barulho e mundo sobre rodas. Ela é fibras e alimentos naturais, Ouve o seu som baixinho (sabe que incomoda) Ele, junto a um de seus iguais, é álcool, é torresmo e tudo mais que engorda. Ela é planta... É um mantra... É o tantra! Ninguém entende o que ela faz com um "pilantra", que gosta de UFC e briga por futebol... Eis um relato do amor entre a lua e o sol.

O OVO DA SERPENTE (Fernando Cavallieri e Ricardo Moreira)

Logo mais, dirão que água é que é veneno E que John Lennon ainda está vivo e é dos Stones, Que o Sol desliga quando o clima fica ameno... Tá demorando a aparecer novo Jim Jones. Dirão que é bom trocar feijão e arroz por feno aos que obtêm graduação pelo I-phone. Filosofar já vai virar gesto obsceno, com punição a qualquer um que o proporcione. O ovo da serpente, há tempos, dá acenos... Pena que só uma minoria anda insone por lamentar não destruí-lo ainda pequeno... e constatar como os cruéis criaram clones. Dirão que é bom trocar feijão e arroz por feno aos que obtêm graduação pelo I-phone. Filosofar já vai virar gesto obsceno, com punição a qualquer um que o proporcione. A cadela do fascismo abriu o dreno... E os “ungidos” se juntaram a Corleone Mas, quem se importa? Segue, que ninguém tá vendo... Hoje, a Palavra é escarrada pelos drones... Logo mais, dirão que água é que é veneno... Que o Sol desliga quando o clima fica ameno... Dirão que é bom trocar feijão e arroz por feno... Filos

A CEREJA E O BOLO (Ricardo Moreira. Texto musicado por Márcio Policastro)

A caravana e o programa de auditório; O caramelo e o aparelho dentário; A caravela e o novo território; O cara de pau e o otário... A acareação e o interrogatório; A carola e o seu confessionário; A carapuça e a ¨culpa no cartório¨; O carimbo e o erário. O carente, a calçada do empório; A carona e o mesmo itinerário Eu, descarado, incorporando esta ao repertório, claramente amparado pelo dicionário

JANTAR DANÇANTE (Ricardo Moreira)

Era início do baile, lá dentro o conjunto tocava " La Mer ". Flagrei-a em seu desembarque, o contraste entre o esmalte e a luva do chofer... Fenda no vestido, um colar de brilhante, o salto no asfalto, meu Deus! Que mulher! Dessas que se devoram com os olhos... Está dispensado o talher. Era início de baile... Creio eu, os garçons distribuíam o couvert Botei na cabeça: “Eis minha ´partner´ na pista!”... “Será que ela quer?!” Um gole de Dry Martini, Nouvelle Cuisine e, aos primeiros acordes de " Love is in the air ". Chamei-a pra contradança. Aceitou. Concluí com sucesso o mister.

BILIONARIOFOBIA (Ricardo Moreira)

Vive por aí dizendo que trata todo mundo com igualdade, mas nunca vi dando "Bom dia" a um bilionário. Em teoria, faz "discurso palestrinha" de humildade; na prática, o que se percebe é o contrário. Esnoba todo restaurante chique da cidade, fica fechado em seu mundinho operário. Insiste em pôr a culpa nos muros e grades, itens, que, nas ilhas, nem compõem o cenário. Fica raivoso ao criticar toda iniquidade, sem ver o quanto sofre um latifundiário. E é até pecado invejar quem tem prosperidade, sobrevivendo quase com o que é necessário. E, pra viver em sociedade, é bom que fique claro: O que seria do malandro, não existisse o otário?

A NOITE FRIA ENSINA A AMAR O DIA (Ricardo Moreira)

Severino trouxe na bagagem  cicatriz e tatuagem que fizera na cadeia, tentando um recomeço sem tropeço ou malandragem... Sabedor que a gente colhe o que semeia. Veio conversando na viagem  com uma moça cuja imagem a princípio lhe era feia, com quem dividira uma hospedagem,  o adeus à agreste paisagem e aos olhos cheios de areia. Um breve papo, coisa de "hora e meia", a filha do "dotô" Gouveia (como se apresentou) instigou no cabra uma coragem, e ele passou a ver vantagem em investir num novo amor. Aprendiz de mágico,  a chamou para assistente e, de pronto, a menina aceitou... Já que o que restou após a compra da passagem era bem pouco e, em poucos dias, acabou. Exercendo a velha maestria em sacanagem, o destino a linhagem aumentou, e o novo casal, que só fugia da estiagem, gastaria em fralda pra limpar cocô. Além de resultar nesta canção, que só vestiu nova roupagem de algo que Belchior cantou, que diz que é preciso uma noite na friagem, para que o dia passe, enfim,

INESGOTÁVEL (Ricardo Moreira, texto musicado por Fernando Cavallieri)

O amor não tem canção definitiva  mesmo após tanta saliva  que se usou com tal assunto...  De forma melancólica ou festiva,  na voz solo de uma diva  ou entoada em conjunto. O amor é tema quase onipresente  com teor terno ou “caliente”,  superficial.... profundo... É que o cupido atinge ateu e atinge crente,  atencioso e indiferente,  em qualquer parte do mundo. Sempre tem quem chora por amor.  Tem sempre um coração flechado pela dor. E até pra quem diz que o amor é uma “flor roxa”  Ele acontece de repente e chega avassalador.  

A CORDA ARREBENTA DO LADO MAIS FRANCO (Ricardo Moreira)

A coisa, de quando em quando, difere daquilo que a gente aguarda, e aquele "Futuro com carros voando" surpreende e devolve o fetiche com fardas. Avanço de um "rococó espartano", que, enquanto Atenas vem baixando a guarda,  empurra goela abaixo seus planos, com armas e punho e cães na retaguarda. É a corda que estoura do lado mais Franco, é o cranco que aumenta, é a cura que tarda... Atenções a um fantoche, um incapaz saltimbanco... Enquanto saí incólume a "Eminência parda". Veja o vídeo

PARANAUÊ DA QUEBRADA (Ricardo Moreira)

Chegou minha folga na escala, pensei que, enfim, eu fosse descansar, mas quem manja dos "paranauê da quebrada" sabe que é cilada, não dá. Esquece, que não tem finesse , sonzinho ambiente, um bom vinho, um foie gras . Tudo é feito com a "sutileza" que Bush usou pra invadir Bagdá. O primeiro que passa é o lixeiro; depois, as testemunhas de Jeová; A Brasília do ovo; a Kombi da pamonha e o rapaz que oferece sofá. O vizinho não larga a Makita, criança que grita em desafio aos pais... A disputa pra ver qual rádio mais irrita e a tal da musiquinha do gás. Tem a calopsita da casa da frente, o cachorro da casa de trás. Só na hora do Brasil Urgente que dá para se ter um pouquinho de paz.

MINDSET (Ricardo Moreira - texto musicado por Sonekka)

Talvez venha a vender uns pães de alho na lagoa da Pampulha caso me falte trabalho; ou, quem sabe, umas coxinhas lá em Caxias pra fazer o meu caixinha, já que nunca fiz conchavos. Outra opção é ir pro pedágio da Imigrantes, vender uns refrigerantes, torresminho e queijo coalho... Creio que em um território tão gigante caiba mais um ambulante batalhando por centavos. Talvez também venha a alugar um patinete pra vender bala e chiclete a algumas jardas dos Jardins. Quem sabe eu vire coach lá no Largo do Arouche, ensinando a enriquecer fazendo estampa em silk-screen. Foi-se o tempo de comer gilete, programei meu mindset e ignoro o que é ruim... Tal teoria, se não cumpre o que promete, eu já li na Internet que dá pra vender um rim.

A FICHA QUE DEMORA A CAIR (Ricardo Moreira)

Só acordou quando, enfim, chegou a conta, e a cidade se encontrava já em escombros. Queria só agradar os seus, fazer afronta... Enquanto alicerçavam o caos, dava de ombros. Aos tempos mais sombrios da história é que aponta  esse roteiro recheado de assombros. Quem vibra com o chicote só se desaponta  ao ver que a fila em que está fornece os lombos. Só acordou quando a opressão bateu-lhe a porta e só o que via ao seu redor era ruína. Achou bastar um diretor gritando “Corta!”, e, assim, só no cinema é que a guerra termina. Sempre há quem viva com ódio irrigando a aorta,  cujo discurso incita o “guardinha da esquina”, mas cabe ao tempo eternizar um Herzog ou um Lorca e enviar ao limbo quem os elimina.

GALINHA DOS OVOS DE OURO (Ricardo Moreira)

Havia ali num bairro de periferia uma pequena academia  com seus cinco funcionários. O proprietário, seu Tenório, a priori, cumpria o seu dever como todo bom empresário. Um dia, ouviu dizer pelo noticiário não ser mais obrigatório um monte de "penduricalho": Adicional de hora-extra, férias, décimo terceiro... "Ora, agradeçam se ainda contam com salário". Foi como se ganhasse alguma loteria,  assim da noite para o dia  e sem gastar com a cartela... Sonhou com lucros que jamais conseguiria com a CLT de guia, se não fosse essa chancela. Refez de modo urgente todos os contratos, sem pensar na consequência. ou, nesse caso, uma sequela... ... que isso se transformaria em tendência adotada por patrões  de toda sua clientela. Quem é que se importa com fisionomia, quando o pouco que se ganha  vai pra dentro da panela?

CARPE DIEM (Ricardo Moreira)

Erga as muralhas e os portões, reforce os programas antivírus, jamais perca de vista seus cartões, relaxe (vendo filmes de vampiros)! Precisamos de seu medo, seus alarmes, suas grades... Precisamos do seu medo e legiões de homens covardes. Precisamos que acredite  em salvações transcendentais, muito sangue escorrendo das manchetes de jornais. Tenha medo... Tenha medo Tenha medo, esteja atento, aja sempre com cuidado com pirâmides, esquemas, frotas de carros clonados... Tenha medo, altere a senha, deixe o histórico apagado e se acovarde e se contenha,  você está sendo filmado.

VERDADES INCONVENIENTES (Ricardo Moreira)

Você pode fazer o esforço que for, que codorna não vira condor; pode ainda ousar na estratégia. mas vitória-régia não vira outra flor. Pra você se limpar lhe dão graxa, dão poncho e bombacha em região de calor... Fazem até com que sonhe com a faixa, mas faixa não encaixa em peito perdedor. Eles querem que você encare a Ferrari na pista lá de Maranello, jogam a culpa caso você pare por soltar as tiras do velho chinelo.

TOUCH SCREEN (Ricardo Moreira)

É lógico que Ana deixaria as digitais...  Se bem que nada que envolva Ana é lógico.  Ela vem de antes dessas redes sociais,  sempre brincou no barro e ia ao zoológico.  Hoje ela espalha que se expor ao vírus "é demais" "É bom! Reforça o sistema imunológico".  Quero deixar bem claro, tranquilizo os radicais:  Não se resume o assunto ao item cronológico.  É que ela nunca leu quadrinhos, livros ou jornais (Dessas que riem com o que é escatológico)  Deixou-se seduzir por essa oferta de canais  que juram ser verdade o que é ideológico... Se sente preparada e, em touch screen, se acha formada  e explica tudo com semblante pedagógico.

TEMPERO DA VIZINHA (Fernando Cavallieri e Ricardo Moreira)

Minha vizinha usa um tempero estranho Um quê de show de reggae  numa praia de Trindade  Vou ver com ela onde é que eu compro,  onde é que apanho  Será que... será que tem lá no mercado da cidade? E todo dia, enquanto eu tomo o meu banho,  eu vejo o fumacê que pelo meu vitraux invade  Será que é caro pra quem ganha o que eu ganho? Será que... será que só se vende em grande quantidade? Se eu for plantar, a poda é feita em qual tamanho? Será que o governo vai criar dificuldade?  Será que os chefs dos programas que acompanho...  Será que dão umas dicas pra se usar com propriedade? Um dia desses, eu prometo que me assanho  e peço um tapaué pra saciar minha vontade,  se for preciso, eu pago à vista e nem barganho  “ai, meu Deus”, é que essa fome chega ser uma crueldade.

HAJA ROLHA (Fernando Cavallieri e Ricardo Moreira)

Sempre que flagrava algum galho, provava de um vinho diferente. Sua amada lhe dava   muito   trabalho e só uma safra era insuficiente. Foi de Cabernet Sauvignon e Carménère, De Malbec e até de vinho quente... de Merlot e de Syrah... Pinot Noir , Moscatel, Sangiovese e Regent. Depois  modificou   as   procedências, pois se esgotaram os ingredientes. E, sem tempo de manter aquele estoque, experimentou de São Roque até alguns do Oriente. Pois a moça não tinha nenhum sossego, E os sommeliers disputavam o cliente. E era ela mesma quem os recebia quando o pobre do Cornélio estava ausente.

CICLO DO MAINSTREAM

 Em grande parte, nasce de uma folha em branco, que algumas letras tingem lhe dando um sentido... Vira canção, faz excursões com saltimbancos, depois que um violão coloca uns sustenidos. Ganha um arranjo com toques de banjo e flauta, dita a pauta dos cadernos culturais, e aí cai nas graças, vai de febre entre internautas a fundo musical que inspira alguns casais. Ganha um arranjo com toques de banjo e flauta, dita a pauta dos cadernos culturais, telões, coreografias, luzes da ribalta, fogos de artifício, orquestras e corais. Mas, desde sempre, existe um ciclo: vida e morte. (E hoje há um recorte de que isso é bem mais fugaz) Ainda que um texto gere visto em passaporte; Muito em breve não encontrará canais. Se veio em busca de palavra que conforte, peço que tome outro norte, volte casas pra trás... Queridos jovens que me ouvem, tenham sorte,  mas notem que até Beethoven parou no caminhão de gás.

BELLE EPÓXI (Ricardo Moreira)

Por favor, será que alguém pode me situar? Uma noção qualquer sobre o horário?!... Volto de um mergulho no universo literário, porém, se disser que solitário, minto: Eu estava com garrafas de absinto. Tentando juntar fragmentos da Belle Epòque, nesses tempos em que o verso anda extinto Talvez digam que isso já “não cole” - e esteja mais pra “belle epóxi” - e que eu seja mais sucinto. Sem fio da meada e perdido no labirinto, em busca de um fim para o meu texto a todo custo. Eis que eu voltei com tudo pronto a este recinto... o telefone me trouxe à real com um susto, Dar parceria a quem ligou é só o justo.

FALTA NA BARREIRA (Ricardo Moreira)

O que é que essa turma maluca injeta que tem lhes causado esse mal à moleira? Tem gente vaiando gol de bicicleta e aplaudindo falta na barreira. Não me choca a gente analfabeta... Me incomoda erguer-se a bandeira De fazer da burrice uma meta. É o cachorro orgulhoso ostentando a coleira. De um lado, a “gourmet feijoada com pétalas”; De outro, os contentes com a xepa da feira. Tá osso manter-se “a espinha ereta” e o “coração tranquilo” hoje nem por zoeira. Quando é infecção, basta uma coleta, para o diagnóstico e a cura certeira, mas, se a distopia se mostra completa, é a humanidade rumo à ribanceira.